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Foto do escritorJoão Marcos Albuquerque

Paris que Dorme (1923) - Crítica

Enquanto Berlin (Walter Ruttmann) busca retratar a cidade sem esconder certa devoção à metrópole, ao progresso e à velocidade (com um ato sobre "A Crise" que destoa do sentimento geral do filme), e O Homem e a Câmera (Dziga Vertov) seguindo por um caminho semelhante (mas com suas muitas peculiaridade e genialidades que enaltecem ainda mais a modernidade), Paris Qui Dort (Renè Clair) parece seguir o caminho inverso.


O impressionismo francês já trazia pro cinema o avesso da modernidade na década de 1920. Ménilmontant (Dimitri Kirsanoff) é discreto no tratamento da metrópole (lócus da modernidade) como corruptora e degradante, mas a crítica não passa batida aos mais sensíveis. E Paris Qui Dort é mais incisiva - há um suicida que culpa a velocidade e o barulho de Paris por seu desejo de morte.


Paris Qui Dort é lúdico, crítico e metanarrativo, brincando com o próprio fato da arte cinematográfica ser composta pela inércia dos fotogramas numa ilusão de movimento. A modernidade acelera todos os processos e movimentos, inclusive colocando em movimento aquilo que antes era inerte (como o cinema faz a partir da fotografia).


Há no filme uma nostalgia e um lamento pela perda da lentidão, metaforizada e levada a cabo na montagem. O uso das fotografias no filme evocam esse tempo perdido, enquanto criticam o aparato cinematográfico como fruto mas também participante central nessa aceleração do mundo. Porém, a Paris que Dorme traz o tédio - não é possível voltar a esse tempo perdido (e mistificado) que justifica essa nostalgia sem levantar problemas ainda maiores. É aí que vem o cinema para tirar o povo do sono e da depressão, para dar movimento à vida (colocando a fotografia em movimento). Há no filme, também, essa dimensão de amor ao movimento, nem que seja o amor pelo movimento como expressado pelo cinema. Há, inequivocamente, um amor pelo cinema (e só ele se salva como aparato da modernidade).


Cá entre nós: sabemos que no cinema a fotografia não se move - há apenas uma ilusão do movimento. Mas é essa ilusão que nos alimenta para seguirmos com nossas vidas em frente - pelo menos é assim que funciona pra mim, e acredito que para o Renè Clair também.

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