Bodies é um filme ousado e pretencioso, mesmo que finja não ser. Sua ousadia e pretensão estão no fato de que, para atingir com sucesso sua conclusão, ele precisa fazer manobras arriscadas para terminar de determinada forma. Contudo, para alcançar este "gran finale", ele sacrifica parte de seu desenvolvimento - que vira refém da conclusão. Os meios são condenados para se atingir o fim, digamos assim.
O filme se perde lá pela metade, quando os personagens fogem do controle, tomando decisões esquisitas, bizonhas, em nada verossímeis. Para disfarçar esta falta de controle sobre suas criaturas, o roteiro dá uma guinada desajeitada para a comédia e o absurdo, tentando convencer o espectador de que, no universo criado pelo filme, é razoavel agir e reagir de forma bizarra desde que seja possível extrair das atitudes e decisões uma critica qualquer, de tonalidade sarcástica ou irônica.
Que crítica é essa, bem, isso fica um pouco embaçado e aberto. Há um desejo de mostrar como as jovens ricas se matam, numa alegoria exagerada da cultura do cancelamento. Um desejo de mostrar como são violentas e reacionárias, mesmo aparentando certo progressismo. Aborda relacionamentos tóxicos, gatilhos, neuroses. Uma incrimina a outra, numa espiral de paranoia interessante, mas que o roteiro não consegue sustentar.
No final das contas, fiquei com a sensação de que não souberam conduzir uma ideia promissora. A diretora Halina Reijn tem um primeiro filme muito promissor, cheio de ambiguidades e nuances sofisticadas que deixam o espectador em estado ativo, julgando os acontecimentos e assim participando de forma construtiva do significado do filme. Bodies faz o caminho inverso, coloca o espectador na posição de observador passivo diante dos acontecimentos incontroláveis que se desenvolvem sem uma linha lógica a qual podemos nos agarrar para tentar prever algo, antecipar algo. Nessa falta de aderência eu, como espectador, escorreguei pra fora da experiência. Fica a impressão de que o filme falhou naquela que seria uma das principais qualidades de um whodunnit: fazer do espectador o detetive, o investigador, a mente inteligente e ativa do outro lado da tela. Ao não levar a sério os sérios desdobramentos que o filme sucede, acaba por não levar a sério o próprio espectador. O problema é que, para assumir essa postura com eficiencia, o filme deveria assumir outras: iconoclastia, rebeldia, idiossincrasia. Ou mesmo ser despretensioso. Não é esse o caso.
Obs: Vi muitas comparações com Agatha Christie, pelo simples fato de ser um whodunnit. Nada mais distante, pelas razões citadas no parágrafo acima.
Bodies Bodies Bodies
Direção - Halina Reijn
Roteiro - Sarah DeLappe
EUA - 1h 34min
Avaliação:
2,5/5
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