Não Existe Estética Boa. Nem Ruim.
- João Marcos Albuquerque

- 2 de ago.
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Penso a estética como experiência sensível, como produção de sensações e experiências que nos atravessam, e de como nos relacionamos com essas experiências. Sendo assim, não existe uma estética “boa” ou “ruim” em si. Existem escolhas estéticas que produzem efeitos distintos, dependendo do contexto, do gesto criativo e da experiência proposta.
Portanto, gosto de pensar a estética numa chave filosófica contemporânea, corroborada por Rancière, Deleuze e Guattari, que desloca a estética do julgamento de valor normativo (“bom/ruim”, por exemplo), para o campo da experiência, da percepção e do afeto.
A ideia de que uma imagem nítida, limpa, de alta resolução, é necessariamente “melhor” do que uma imagem granulada, instável ou de baixa qualidade técnica é, ao meu ver, uma forma limitada, quando não equivocada, de pensar a estética. Afinal, acredito que a estética não deve ser medida por parâmetros técnicos, mas pela coerência entre forma e sentido.
Em Império dos Sonhos (2006), David Lynch utiliza uma câmera digital já ultrapassada na época das filmagens. A imagem é suja, instável, pouco nítida, com profundidade de campo reduzida. Mas essa suposta limitação é expressiva. A precariedade visual acentua o estranhamento, o delírio, o horror que atravessa todo o filme. A “feiura” da imagem não é “ruim”: é atmosfera.

Já em Não é um Filme Caseiro (2015), Chantal Akerman filma com câmeras digitais domésticas - webcam, celular Blackberry. As imagens não possuem refinamento técnico, mas revelam algo muito mais difícil de alcançar: uma estética da intimidade. A sensação de proximidade entre diretora e espectador emerge justamente da simplicidade dos dispositivos usados, de sua crueza cotidiana, da familiaridade dos enquadramentos improvisados.

A estética não deve ser julgada como “boa” ou “ruim”, mas compreendida a partir de seus efeitos e propostas. O importante, no cinema, é a relação entre o que se quer expressar e a forma que se encontra para expressar. Às vezes, uma câmera de celular pode ser a escolha mais potente. Porque cinema não é sobre alcançar uma imagem considerada perfeita em termos de “padrão de qualidade”: é sobre criar imagens que nos atravessam. É preciso acabar de vez com a associação capitalista entre alta tecnologia e arte, entre estética e julgamento de valor normativo.





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